domingo, 6 de fevereiro de 2011

Um tiro no escuro

Era um dia ensolarado naquela pequena cidadezinha cujo nome não importa. Basta você saber que era o tipo de lugar onde todo mundo se conhece, e tudo que você faz tornam-se comentários (na maioria maldosos). Nessa cidade tinha apenas uma escola. Voltada aos velhos costumes, com irmãs ditando o que se aprende e o que não se aprende. Em uma turma que se equivale a nossa quinta ou sexta série, um grupinho de amigos pintava e bordava pelas redondezas.
É sério, todo mundo sabia quem eram os garotos e, se algo errado acontecia, era culpa deles. Importunavam as igrejas, supermercados, casas de velhos, etc. Aliás, falando em casas de velhos, tinha uma em especial em que eles adoravam invadir para roubar coisas e pixar as paredes: o lar do velho Zé. O tal do Zé já era um velhinho beirando os oitenta anos e nada pudia fazer com os moleques, já que eles entravam na casa quando o mesmo ia pescar ou algo do tipo. Decidido a mudar o quadro de infortúnio de sua terceira idade, resolveu comprar uma espingarda. Não contou para ninguém e guardou a espingarda bem escondida, para que os moleques não a encontrassem. E avisou muito bem avisado: da próxima vez que eles entrassem lá, iam sofrer as consequencias.
Claro que esses garotinhos ouviam isso toda vez que infernizavam alguém. Já era de praxe. Não deram bola ao Zé, que nas suas opiniões não passava de um velho babão, e entraram mais uma vez na casa do homem, afinal ele estava curtindo sua pesca de quarta.
Entraram excitados, arrombaram a porta com tudo. Mijaram nas paredes, defecaram no aquário, penduraram o cachorrinho do segundo andar. Tudo que se possa imaginar de ruim. Até que, eles ouvem o barulho da porta da cozinha se abrindo. É o velho Zé, que voltou mais cedo. Decidem se esconder atrás de uma estátua bem grande de um velho filósofo (talvez Aristóteles, não sei). 
O velho Zé foi caminhando bem devagarinho, sem alarde. Quando passou pela estátua, os garotos saltaram por trás do idoso e se atracaram nele como se não houvesse amanhã.
Ouviu-se um estrondo.
Sem querer, o velho apertou o gatilho e acertou sua própria cabeça.
Os garotos, banhados de sangue, ficaram calados por um momento. Depois, rompem em gargalhada. Afinal, não era irónico? Qual o peso de uma morte, afinal?

3 comentários:

  1. O.O História louca.
    Esses moleques desgraçados que não tiveram educação e discernimento. Chega uma hora que o limite é alcançado, então temos que respeitar.
    Cara, texto simplesmente incrível. Muito ótimo mesmo!
    O velinho ainda gostava de um filósofo famoso. Logo, era inteligente. Não merecia morrer desta forma fútil.
    Mais uma vez, parabéns xD

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  2. Adorei.
    Mas Lucas, os limites é a sociedade que impõe. Eu faço minhhas próprias regras que podem ou não condizer com esses limites e também não posso dizer o que o outro pode ou não fazer. Você acha que temos que respeitar mas eu acho que eu tenho que respeitar e prefiro não "me meter" se o outro não respeitar, com exceções, claro.
    Não acho que seja uma forma fútil de morrer, ele morreu tentando defender suas causas, lutando. Achei admirável.
    E quanto as crianças, eu faço a mesma coisa no video game, claro que eu não faria na vida real porque não quero ser presa e porque depois eu sentiria um peso na conciência, mas qualquer um tem a capacidade de matar outra pessoa, assim como tem a capacidade de se matar.

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