quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Rolling Stones "Beggar's Banquet"


Não é raro hoje em dia nos encontrarmos discutindo se as coisas do passado eram realmente tudo isso e se não vale a pena dar uma chance pro que há de novo. Acho uma discussão muito bacana, mas que não cabe aqui. Comecei falando disso porque dessa vez vou resenhar um disco antigo, de 68, e que talvez ninguém esteja afim de conhecer (se já não conhece de cabo a rabo). Mas ei, é Rolling Stones. E esse disco é uma prova de que as coisas do passado, são sim, muito especiais, e nunca vão morrer - até porque sempre vai ter um Veliko pra falar sobre elas de novo. E de novo e de novo.

Veja bem, estamos no final dos sessenta quando esse disco é lançado. Na Inglaterra  e no mundo todo explodem movimentos de jovens revoltados que reivindicam, bem, sei lá o que. Os Beatles já não são mais aquelas coca-cola e novas bandas mais sombrias vem surgindo da cena underground, como Black Sabbath e Led Zeppelin. Os Stones absorveram esse cenário melhor do que ninguém para entrar numa de suas fases mais produtivas, deixando para trás ilusões psicodélicas e a velha ambição de atingir o primeiro lugar pra começar a fazer o que eles realmente queriam fazer. Blues. Músicas sobre as pessoas do dia a dia. Agora como músicos mais maduros, eles tinham de tudo pra ser os melhores bluesmen de todos os tempos. 

Nada como Sympathy For The Devil para abrir essa obra prima, né? Já mostrando que os Stones não tinham medo de ninguém, misturaram ritmos brasileiros depois de uma viagem que fizeram pra cá com uma estrutura que se parece muito com músicas de Bob Dylan. São os três acordes mais usados no rock com uma batucada maluca no fundo e uma letra com alto teor político. Pra mim, Sympathy tem uma das melhores linhas de guitarras na história do rock, o fuzz característico dos Stones é inconfundível e apesar de ser algo simples, ditou as regras das bandas subsequentes por muitos anos. Faixa clássica.

Mas como álbum bom é álbum completo, Beggars Banquet não deixa cair a peteca com a linda balada No Expectations. Nesse disco a poesia de Jaggers está muito forte e com uma baladinha dessas maravilhosa acompanhada por guitarra slide e baixo marcante, os versos soam ainda mais bonitos. Aqui se fala de uma mulher, provavelmente, em que o eu lírico abandona pra nunca mais vê-la. Porém, ao contrário das músicas dos Stones, não é machista e até se mantém um certo respeito por essa mulher misteriosa que o deixou sozinho. A perfeição da música se encerra numa belíssima linha de piano que te faz enxugar as lágrimas pra partir adiante nessa viagem.  Até que ouvimos a voz de ninguém menos que Keith Richards e então nos sentimos em casa. Dear Doctor é puro blues e puro Rolling Stones. Tem gaita, tem violão de aço, backing vocals que parecem estar bêbados e aquela letra sacana de sempre.

Parachute Woman é um blues cadenciado com gait como já conhecemos. Parachute woman, will you blow me out? Pergunta Mick Jagger. Não, ele não tá falando sobre mudar o mundo nem sobre submarinos amarelos, só sobre alguma mulher com quem ele dormiu na noite passada. É esse o tipo de sinceridade e deboche que depois inspiraria tantos poetas das nossas vidas como Iggy Pop, David Bowie, Lou Reed, a fazerem músicas sinceras sobre a vida. Não sobre coisas intangíveis. Uma tarde na rua, jogando quebra-cabeças, antes da chuva cair, você prefere? Beggars Banquet também tem uma música sobre isso. Tão deliciosa que soa muito bem como só esse disco consegue soar. Pessoas estranhas passam na rua num típico cenário urbano e tudo o que ele quer é jogar seu joguinho. Até há uma brincadeira com a própria banda nessa letra, quando ele diz, por exemplo, And the bass man, he looks nervous, about the girls outside. Falando em Bill Wyman, só tenho a dizer que, como baixista também, os graves desse disco são maravilhosos, desde Sympathy com sua linha cheia de groove até algo mais melódico em No Expectations e nesta Jigsaw Puzzle. Parabéns, Bill.

Agora, num momento mais ambicioso no sentido poético da banda, há o clássico Street Fighting Man. Como disse Jagger uma vez, nessa canção ele se viu como um jovem inglês trabalhador que sai em um protesto pelas ruas de Londres. A falta de perspectiva da sociedade dessa época pela parte da juventude é refletida nessa poesia, que diz que nessa cidade dorminhoca não há lugar para um cara que briga nas ruas. Algo como, pegue um trabalho e se acomode com isso até a sua morte. Bom, revoltas a parte, há de se comentar que os Stones nunca passaram por isso até porque são rockstars que vivem a vida mais legal do planeta, mas de qualquer modo fica uma tentativa de captar toda essa angústia jovem de quem olhava de perto todos esses acontecimentos. Uma música clássica que ficará para sempre entre as nossas preferidas.

Prodigal Son, a próxima faixa, é um cover de Robert Wilkins, e que faz parte da mania chata deles de colocar blues desconhecidos em tudo o que fazem. De qualquer forma, é uma música divertida. Mas boa boa mesmo é Stray Cat Blues, Charlie Watts dá as suas caras com o chimbal sempre inquieto e aquela sua batida peculiar. Diz Jagger que a música foi inspirara por Heroin, do Velvet Underground. Não sei se parece muito, uma guitarra distorcida realmente lembra, mas são duas músicas muito boas que valem a pena serem ouvidas por todo mundo que curte um bom rock n roll. A letra conta a história de um homem que dorme com uma novinha de 15 anos e diz que não é crime capital hahaha. Realmente, não dá pra esperar que os Stones não escrevam uma música sequer sobre sacanagem.

Mostrando a vertente folk da banda, temos Factory Girl, quase encerrando o disco. A percussão esquisita tá lá também, mas quando você tá curtindo o som, ele já acaba, porque só são dois minutinhos. Pra fechar com chave de ouro o álbum Beggars Banquet (e essa resenha também), Jagger e sua turma nos presenteiam com Salt Of The Earth. Novamente, uma linda balada, que infelizmente ficou de fora da memória da própria banda pra incluir nos seus repertórios (assim como muita coisa desse disco), o vocal de Richards se sobressai numa ode aos trabalhadores comuns do mundo. No fim há um coral de negonas repetindo os versos num feeling de matar que te faz acabar a audição com um sorriso no rosto. Embora na música o povo comum seja exaltado, não há de forma alguma uma intervenção social que proponha uma mudança nas suas vidas. Nota zero na redação do ENEM pra eles. Mas enfim, fossem lá quais suas intençôes escrevendo essas letras mais sociais. temos de admitir que nos renderam ótimas canções que permanecerão eternamente como fonte de discussão e porque não, prazer.

Por isso mesmo, dê uma pausa no teu Black Keys ou Tame Impala e volte cinquenta anos para um tempo onde ainda havia espaço para instrumentos reais e poesias reais, onde o feeling estava no primeiro lugar. Um salve ao Rock N` Roll!

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Quando vamos nos deitar, é fácil perceber como a vida é curta. Recapitulamos tudo o que fizemos e começamos a entender que falta muita coisa a fazer. Quando acordamos, parece que tudo isso fica pra trás e não tomamos conta de quanto tempo perdemos. Não que dormir seja uma perda de tempo. Pelo contrário: é muito prazeroso, e tudo o que nos dá prazer com certeza não é uma perda de tempo. Podíamos passar a vida nos distraindo. Mas quando tentamos, uma moça bonita passa pela calçada e ficamos debruçados sobre a janela, esperando ela passar de novo. Passa dia, passa noite. E nenhum sinal dela. Enquanto isso, milhares de pessoas passam ao nosso redor – algumas até falam conosco -, mas não damos bola. Só porque é muito mais cômodo pensar em uma só coisa, mesmo que essa coisa não venha nunca. É claro que, inclusive nós sabemos disso, se ampliarmos nossas apostas para umas mais fáceis, nos livramos de uma possível frustração. Mas é sempre a mesma coisa: estamos nos frustrando dia após dia. E não, eu não vou tentar diagnosticar nossa doença, muito menos propor uma cura. Simplesmente porque nós somos assim. Não por uma determinante natural, por algo de nascença... Também não tem nada de especial nisso. Mas então, posso voltar pra nossa rotina, como comecei. Posso falar que escovamos os dentes, tomamos banho mesmo quando é de manhã e tá frio pra caramba, vamos pra escola sem a mínima vontade de aprender, comemos a comida que tá na mesa: e pronto. Que beleza, podíamos até tentar um parágrafo novo. Mas vamos insistir nesse mesmo. Podíamos ter deixado isso oculto, pra que alguém entendesse depois. Agora vocês estão até escrevendo comigo! Não preciso explicar pra ninguém. E isso poderia ficar oculto, de novo. Vamos ficar brincando de procurar o Wally, então, que é melhor. Mas agora deixa eu dizer pra vocês (e isso eu digo sozinho, tudo bem?): por que só um? A vida é muito curta pra apostarmos todas nossas fichas em um só cavalo. Não diria também pra simplesmente jogar o passado pra trás: às vezes o passado é a melhor matéria prima pra se escrever um texto como esse. E eu estou preso no passado. Minha menina dos olhos ainda não deu as caras na minha rua. Escrevo porque gosto. Porque gosto que as pessoas leiam. Dessa vez pedi uma mãozinha pra esse aqui, e provavelmente está tão ruim quanto os outros. Mas se trata de um exorcismo. Se escrever não tem esse poder, então não sei mais em que acreditar. E talvez eu esteja sendo radical demais. Talvez só precise ir deitar, rolar na cama por algumas horas recapitulando toda minha vida. Sonhando, vendo ela passar pelos meus sonhos. Guardando toda a dor do mundo... O vento passou pela janela, só Carolina não viu. Afinal, quem quer ser Carolina?