quinta-feira, 14 de julho de 2011

Mais Alguns Parágrafos

No rosto refletido pela lagoa iluminada à meia-luz jazia um certo desespero, misturado à uma pseudotranquilidade, por mais que essas duas sensações pareçam ser opostas uma a outra. O suor pingava da testa até a água, e os sapos saíam da terra para ir nadar, e vice-versa. Com as duas mãos, o sujeito lavou seu rosto repetidamente como alguém que tenta lavar a alma de um pecado horrendo com água benta. Era inútil, a sua retina ainda continha aquela imagem terrível, enquanto a retina do velho Sebastião ainda continha a sua imagem: a figura do assassino, que agora chora sem parar à beira da lagoa.


Quando nascem, as crianças de boas famílias crescem com a ideia de separar quem é do bem, e quem é do mal. Paulo, de fato, foi uma dessas crianças. Quando poderia imaginar-se um assassino? Em contexto algum tamanho absurdo seria um futuro palpável, era impossível: criado com a melhor das educações que uma família classe média podia lhe dar, formado em um dos melhores colégios particulares da cidade. Jogava bola todos os finais de semana, tocava violão e tudo o mais. Ao crescer, infelizmente, caiu na problématica que muitos recém-adultos se encontram: desempregado, desiludido e o pior de tudo, apaixonado por uma menina da sociedade. 


Por um amor que supostamente devia estar morto nos romances do século dezoito, devido suas proporções românticas sem tamanho, Paulo assassinou um homem de idade, de posses e influência, em nome de sua amada. Mal conhecia o coitado, então a ideia de assassiná-lo por dinheiro e perspectiva na vida pareceu-lhe aceitável. Apenas um fato parecia ao mesmo tempo puxar-lhe para um lado e para o outro: o velho Sebastião era ninguém menos que seu pai biológico. O homem que teve um caso com sua mãe, a boa Dona Clô e fugiu de casa, deixando para ela apenas a esperança de um dia tudo ficar bem novamente.


Simultaneamente, o ódio por um traidor e a compaixão por um familiar tomaram o coração de Paulo, que de fato gostaria muito da herança que essa morte poderia lhe proporcionar. O casamento, a estabilidade, uma nova casa, um carro, tudo, tudo pesava na balança de um sujeito desgraçado que nada tinha a perder com esse crime, apenas sua sanidade. Não que ela estivesse sã só de deparar-se com a ideia do ato, mas poderia ir água abaixo de vez.


A conclusão desse dilema vocês já sabem, e talvez a falta de clímax tenha os decepcionado bastante. Mas não há como ignorar que, como Paulo, são poucos os que abandonam sua sanidade para tomar um rumo tão obscuro em suas vidas. Na maioria do casos, a opção de manter ou não uma mente sã não existe. E para os que nascem assim, só mesmo a sorte para afortuná-los de uma vida boa, ou se não vivem da desgraça mais desgracenta possível, daquela desgraça que é tão desgracenta que os engraçados ainda tentam deixar mais desgraçada ainda. E conseguem.

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