quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Tame Impala "Lonerism"

“And I know there I gotta be above it, now”


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Abrindo com esses versos, estamos adentrando numa atmosfera de solidão e melancolia em um dos discos mais interessantes desse ano. Depois do aclamado “Innerspeaker”, de 2010, que inclusive foi resenhado aqui no Veliko, a banda australiana Tame Impala nos presenteia com seu esboço de álbum conceitual chamado “Lonerism”. Esboço, sim, porque não dá pra definir claramente o que esses malucos do novo rock psicodélico quiseram dizer com esse disco. Você pode ouvir até o final e ficar com muitas perguntas na cabeça. Uma delas será com certeza: “Afinal, eles conseguiram superar o que já era quase perfeito?”. Vamos dar uma volta antes de responder a essa pergunta.

Primeira coisa: o Tame já não é mais o mesmo de dois anos atrás. Sim, eles atingiram um marco com um álbum excelente nas costas, aclamados pela crítica e pelo público, fazendo vários shows nos principais festivais pelo mundo. Então, é óbvio que essa carga adiciona (ou toma de volta) muita coisa de um artista. Kevin Parker que o diga. Gravou um álbum praticamente sozinho e agora tem uma banda – ainda maior, com o advento de Jay nos teclados e um novo baterista no seu lugar – a ajuda-lo nas composições e arranjos em geral. E muitos vão tomar um susto, pois as guitarras com seus efeitos característicos dão um descanso nesse álbum pra dar lugar a camadas e camadas de sintetizadores. Sim, o som light e viajante da banda agora está denso, às vezes cheio demais, até.


Esse é o cara!
Mas como Tame é Tame, os caras usam e abusam de efeitos – até na bateria! A primeira canção, Be Above It, causa estranheza com sussurros no fundo e uma batida hipnotizante que camuflam uma linda melancolia, como nunca antes vista em uma faixa da banda. E o álbum segue quase todo nesse clima nas melodias grudentas que expõem uma verve intimista que já era familiar aos ouvintes em Solitude Is Bliss, do álbum anterior. Aos fãs da sonoridade clássica de Kevin Parker e companhia, a faixa seguinte Endors Toi é talvez a mais próxima do Tame de 2010. Guitarras predominando, com efeitos de sobra, vocal John Lennon cheio de reverb, e um Jay pirando lá no fundo. Aliás, preste atenção no tecladista em quase todo o álbum. O cara é insano.

Pra quem gosta dessa vibe do Inner, dá pra curtir a excelente Music To Walk Home By, que casa perfeitamente a sonoridade das guitarras com os sintetizadores, os vocais ecoando por trás. É uma música pra ser ouvida várias vezes, até que se percebam todos os detalhes. Mas, (in)felizmente, essa liga dura pouco até as próximas músicas. As guitarras simplesmente desaparecem e temos uma predominância quase que completa pelos teclados, a batida regular da bateria enquanto Kevin canta versos repetitivos como Why Won’t They Talk To Me. É um lindo tema mesmo, alguém se desapegando das outras pessoas para se tornar um completo solitário. “But I don’t really care about it, anyway”. Atenção para a próxima faixa, um genuíno reggae psicodélico com uma linha de baixo inspiradíssima (assim como em todo o álbum, os graves marcam presença), Feels Like We Only Go Backwards. O refrão gruda na cabeça, cuidado.

Aliás, eu pulei algumas músicas. Só pra não passar batido, Mind Mischief é simplesmente uma decepção e a música mais fraca do álbum. Entra com um riff interessante que logo desempolga pela sua repetição ao longo de três minutos. Dispensável. Boa mesmo é Keep On Lying, que apesar de uma estrutura simples e repetitiva, com criatividade os instrumentos vão entrando e pedindo cada vez mais a sua atenção pra culminar num instrumental elaborado ao som de alguns diálogos ao fundo (Pink Floyd?). Uma característica de Lonerism é que, diferente do Innerspeaker, o disco não deixa cair a peteca e te faz ouvir até o fim sem maiores complicações (alguém falou em Jeremy’s Storm aí?). Até a curiosa She Just Won’t Believe Me é interessante, mesmo que Kevin Parker repita a mesma frase por um minuto daquele jeito que só ele sabe fazer. 


Quero ver tocar Lonerism ao vivo...
Depois de falar de quase todas as músicas, deixei um espaço reservado pra comentar das duas melhores músicas do álbum, ouvidas exaustivamente antes de a obra completa ter vazado na internet. Sim, falo de Apocalypse Dreams e Elephant. A primeira é levada pelo piano quase-Beatles, apresentando camadas densas e refrão poderoso, explora os vocais agudos de Kevin Parker e a nova instrumentação da banda, agora mais complexa. A segunda, então, já entrou no hall de clássicas junto de Solitude Is Bliss e Half Full Glass Of Wine, com sua linha penetrante de baixo que demonstra um peso até então nunca antes sentido no som do Tame Impala. E o miolo, épico, conduzido pelo órgão de Jay e as guitarras em coro de Dominic e Kevin? Simplesmente uma das melhores coisas produzidas nos últimos tempos.

E então temos o fim do álbum. Tristinho, melancólico, pra baixo, deprê. Depois de passar por todos os canais interiores da solidão, o ouvinte desbanda num caminhar sozinho, na praia, rumo à completa isolação. As pessoas falando lá no fundo, mas você não liga. O que importa é seguir em frente, você já renunciou tudo aquilo o que as pessoas amam tanto. Você pode ser feliz mesmo não tendo ninguém. Talvez, por baixo do atmosfera misantrópica do disco, temos uma mensagem de esperança em Sun’s Coming Up (uma faixa inglesa demais para uma banda australiana). Guiada apenas por piano e voz, é praticamente uma mão amiga pra se chegar ao fim de uma jornada de cinquenta minutos que é ouvir Lonerism. Voltando à pergunta inicial, se “Lonerism é melhor do que o Innerspeaker”, realmente, não é. Trata-se de uma obra bem menos sólida, apesar de ter um conceito mais definido, o que pode ter causado dificuldades na concepção do disco. Mas isso é difícil de afirmar. O importante é que ao invés de se acomodar e fazer cover de si mesmos, os australianos decidiram dar um passo a frente. E isso é muito positivo. Mesmo que seja um passo solitário. A gente vai estar lá do lado. 

4 comentários:

  1. Só pra constar, Keep On Lying é no páreo com Apocalypse e Elephant =)
    Mas sinceramente? Só ouçam, fechem os olhos e viagem no quase subconsciente que o álbum atinge.

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  2. Achei Lonerism muito plástico, sei lá, às vezes soa repetitivo também, mas é um álbum regular. A sonoridade de Innerspeaker é mais sólida.

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